Conheça a história da hipnose no Brasil, desde 1823 até os dias atuais, através de personalidades como o Dr. Francisco de Paula Fajardo Jr. e o psicólogo Karl Weissmann.
História da Terapia por Hipnose
Foi em 1823, que o hipnotismo recém-chegado ao Brasil teve publicado seu primeiro trabalho científico através de João Lopes Cardoso Machado, com citações sobre o método no seu “Dicionário Médico-Prático”.
Em 1832, Leopoldo Gamard, publicou a “Monografia Sobre Magnetismo Animal” sendo seguido em 1857 por José Mauricio Nunes Garcia que trouxe à luz seus “Estudos sobre a Fotografia Fisiológica”.
Cabe observar que o termo “magnetismo animal” foi introduzido pelo médico alemão Franz Anton Mesmer em 1773. Já o termo “hipnose” foi apresentado pelo médico-cirurgião escocês James Braid em 1843.
A aplicação do magnetismo, despertado por esses pioneiros, provocou intensa mobilização nos meios médicos brasileiros, culminando em 28 de maio de 1861 com a fundação da Sociedade de Propaganda do Magnetismo e Jury Magnético no Rio de Janeiro, que teve seu funcionamento autorizado em 03 de maio de 1862 pelo Governo Imperial. É interessante ressaltar que a entidade nasceu com a recomendação de D. Pedro II que enfatizava: “as experiências e as aplicações devem ser feitas por médico competente e reconhecido”.
Artigo do Dr. José Baliseu Neves Gonzaga Filho.
José Baliseu Neves Gonzaga Filho, doutor em medicina, publicou uma série de artigos sobre o magnetismo animal na seção de ciências do Diário do Rio de Janeiro nos anos de 1875 e 1876.
De 1876 a 1887 a técnica do magnetismo animal foi enriquecida com a publicação de inúmeros trabalhos, sobressaindo-se os de Mello Morais, Dias da Cruz, Ferreira de Abreu, Gama Lobo, Gonzaga Filho, Morais Jardim, Calvet, Lucindo Filho, Sá Leite e Affonso Alves.
Com Érico Coelho em 1887, através da apresentação de trabalho versando sobre o tratamento do beribéri pela sugestão hipnótica, na Academia Imperial de Medicina, iniciou-se a fase realmente científica da hipnose em nossa terra. Em seguida, em 1888, Cunha Cruz apresenta seu trabalho inteiramente dedicado à tocoginecologia intitulado “Hypnotismo e Sugestão com Aplicação à Tocologia”, sendo seguido por Francisco Moura com “Physiologia Pathológica dos Phenomenos Hypnóticos”.
Todos os trabalhos derivavam da evolução do hipnotismo no velho continente e continham forte influência francesa. Também com essa característica, na Faculdade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro, em 1888, foi apresentada a primeira Tese de Doutoramento sobre o hipnotismo, por Francisco Fajardo Jr.
Congresso de medicina com trabalhos sobre hipnose.
Em 1889 ocorreu no Rio de Janeiro o II Congresso Brasileiro de Medicina e Cirurgia que incluiu trabalhos sobre hipnose de Alfredo Barcello, Aureliano Portugal, Francisco Fajardo Jr. e Érico Coelho. Com a publicação dessas monografias, surgiram no Brasil os primeiros trabalhos sobre hipnotismo em nosso meio. Isso nos leva a fazer considerações sobre o importante papel desempenhado por Fajardo na trajetória histórica da hipnose.
Francisco de Paula Fajardo Jr. nasceu na Fazenda da Cachoeira, no Estado do Rio em 1864, e cursou a Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, onde colou grau em 1888, sendo aprovado com distinção ao defender sua tese de doutoramento “O Hypnotismo”. Em vista do sucesso da tese, ampliou-a e a lançou como um “Tratado de Hypnotismo” em 1896.
O livro de Fajardo captou os ecos da célebre polêmica que ocorria entre as Escolas de Paris e de Nancy e foi elaborado debaixo do estímulo de Érico Coelho, que introduzira o método hipnótico no Brasil. Focalizava ainda os resultados obtidos por Francisco de Castro, Miguel Couto, Teixeira Brandão e outros grandes médicos da época. Seu autor já era consagrado pelas pesquisas nas áreas da química, bacteriologia obstetrícia, ginecologia, parasitologia, medicina tropical, medicina sanitária e higiene.
Primeiro tratado sobre hipnotismo.
Colhido em sua brilhante trajetória quando se encontrava em seu auge, Fajardo faleceu em 6 de novembro de 1906 com 42 anos de idade, apesar de todos os cuidados que lhe foram proporcionados por Miguel Couto. Seu túmulo, no Cemitério João Baptista, no Rio de Janeiro, traz epitáfio de Álvares de Azevedo: “Vivo, não vi quem fosse tão querido, morto, não vi quem não fosse tão chorado”.
Graças à sua experiência pessoal e chegando a conclusões categóricas, seu livro ficou na história bibliográfica como o primeiro tratado de hipnotismo lançado no meio brasileiro.
Seguiram-se as teses “Ensaio Médico-Legal sobre o Hypnotismo” de José Alcântara Machado de Oliveira em 1895 e “O Hypnotismo Sob o Ponto de Vista Médico-Legal” de Augusto Ribeiro da Silva em 1900.
Medeiros e Albuquerque (1919).
Devemos ainda nos referir ao nome de Medeiros e Albuquerque, que apesar de leigo, publicou um livro de grande valor em 1919, logo após a Primeira Guerra Mundial. “O hipnotismo e suas aplicações” foi prefaciado por Miguel Couto e Juliano Moreira, sendo ainda hoje apreciado por muitos hipnotistas.
Em 1938 chegou ao Brasil o psicólogo austríaco Karl Weissmann. Ele nasceu em Viena, Áustria, em 24 de julho de 1910 e faleceu no Rio de Janeiro em 25 de março de 1990. Veio para o Brasil em 1938, fugindo dos horrores da II Guerra Mundial. Inicialmente foi ser psicanalista na penitenciária das Neves, em Belo Horizonte.
Foi criador do termo “Freud explica”. Mantinha uma coluna na antiga revista O Cruzeiro (hoje desaparecida) com o mesmo nome. Também era autor do livro “Que é psicanálise? Freud explica”. Foi o divulgador do hipnotismo científico no Brasil. Na década de 50 foi professor de hipnose de uma geração de médicos. Fazia apresentações na TV e dava entrevistas no rádio e jornais da época.
Embora tenha sido professor dos médicos organizadores do I Congresso Pan Americano de Hipnose realizado em julho de 1961, no Rio de Janeiro, foi proibido de participar do mesmo pelo simples fato de não ser médico. Ministrou cursos de hipnose em diversas cidades brasileiras. Publicou oito livros, com destaque para “O Hipnotismo, Psicologia, Técnica e Aplicação”, que teve quatro edições. Esse livro o tornou famoso. Dizia que “hipnotizar é sugestionar, sugestionar é convencer, só sugestiona quem convence e só quem convence hipnotiza”.
Karl Weissman foi amigo e discípulo de Freud, de quem guardava em seu consultório, num quadro, uma das últimas cartas do mestre em resposta ao seu primeiro livro “O Dinheiro na Vida Erótica”.
Voltando para 1956, David Akstein, Álvaro Badra, Maurício de Medeiros e Fernando Negrão Prado trouxeram o psiquiatra argentino José Torres Norry para uma série de conferências e cursos que se realizaram no Rio de Janeiro, São Paulo e Campinas. José Torres Norry foi responsável por uma nova era do hipnotismo no Brasil, com momentos importantes como a conferência que realizou em 27 de julho de 1956 no auditório do Ministério da Educação, sob a presidência do então Ministro da Saúde.
Logo em seguida, em 1957, fundou-se a Sociedade Brasileira de Hipnose Médica, que foi inspiradora de inúmeras sociedades congêneres que se espalharam por diversos estados brasileiros.
Primeira regulamentação da hipnose.
Quando o presidente Jânio Quadros, pelo Decreto 51.009 de 22/07/1961, proibiu shows públicos de hipnose, assinou a única lei que regulamentou essa técnica no Brasil. Na época ele implicou também com o uso do biquíni. Nenhuma das duas proibições jamais foi obedecida. Trinta anos depois, o então Presidente Fernando Collor de Mello revogou totalmente essa norma, através do Decreto 11 de 18/1/1991 (Publicação Original – Diário Oficial da União de 21/01/1991).
Atualmente a hipnoterapia ou hipnose clínica não é uma profissão regulamentada no Brasil. A hipnose pode ser aplicada em todos os segmentos e especialidades da saúde, como também em diversas outras áreas, como educação, esportes e recursos humanos, dentre outras.
Vários Conselhos Federais possuem em seus códigos de conduta e normas de procedimento definições para a utilização da hipnose. O Conselho Federal de Odontologia foi o primeiro órgão representativo de uma categoria profissional que reconheceu a hipnose como ferramenta clínica (1993), seguido pelos Conselho Federal de Medicina (1999), Conselho Federal de Psicologia (2000) e Conselho Federal de Fisioterapia e Terapias Ocupacionais (2010).
Hoje existem diversas experiências de sucesso relativas ao emprego da hipnose em hospitais no Brasil.
Hipnose desde 1995.
O Hospital das Clínicas de São Paulo vem utilizando a hipnose desde 1995 para auxiliar no tratamento de pacientes com ansiedade, dores crônicas, em trabalhos de parto e também como auxílio em casos de sedação para cirurgias de pequeno e grande porte.
O Hospital São Camilo, também de São Paulo, vem realizando o trabalho de hipnose clínica desde 2008. Eles têm obtido sucesso em reduzir a ansiedade de paciente claustrofóbicos que necessitam passar por exames de ressonância magnética e também no caso de pacientes com dores crônicas, náuseas e tabagismo.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) vem estimulando o uso da Medicina Tradicional/Medicina Complementar/Alternativa nos sistemas de saúde de forma integrada às técnicas da medicina ocidental moderna. Seguindo esta orientação, em 12 de março de 2018, o Ministério da Saúde incorporou ao Sistema Único de Saúde (SUS) a hipnoterapia como uma nova prática de medicina integrativa e complementar.
Em 01 de fevereiro de 2018 ocorreu um novo reconhecimento da hipnose no Brasil, quando o então governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, sancionou a lei de número 16.670 referente à criação do “Dia Estadual do Hipnólogo”, que será celebrado anualmente em 25 de setembro.
Saiba mais a respeito da hipnose clínica
Bibliografia
- AKSTEIN, David, “Hipnologia – Vol. I” Editora Hypnos, RJ, 1973
- FAJARDO JR., Francisco, “Tratado de Hipnotismo”, Ed. Laemmert & Cia. RJ, 1896
- MAIA, Joel Priori, “História da Hipnose e A Hipnose no Brasil”, Apostilas de Aulas – Hemeroteca da Sociedade de Hipnose Médica de São Paulo, 2000
- RIBAS, João Carvalhal, “Antologia Psiquiátrica – Francisco Fajardo: O Primeiro Tratado de Hipnotismo no Brasil”, Revista de Psiquiatria Clinica 11(1–2):29–1982-Cl. Psiq.- F.M.U.S.P.
- Dr. Joel Priori Maia – Psiquiatra
- Site do Senado Federal
- Site do Ministério da Saúde
- Site do Jornal O Estado de São Paulo
- Site do Jornal O Globo